terça-feira, 21 de maio de 2024


HISTÓRIA Nº. 116

 

“Agora sei: sou só. Eu e a minha liberdade que não sei usar. Grande responsabilidade da solidão.”

- Clarice Lispector

 

Restava ainda alguma ingenuidade. Restava, disse bem, porque já não resta. Sentia-lhe já alguma fragilidade, mas entendeu conceder-lhe o benefício da dúvida. Durou, por isso, muito tempo, até mais do que determinadas idades consentem. Costuma esgotar-se bem mais cedo, normalmente na fase da vida em que se desperta do sonho e se encara a dura realidade. Mas o Alemão, contrariando a sua propensão pessimista, prolongou-lhe a vida, acreditando na pureza e consequente longevidade da nobreza de sentimentos que sempre tanto admirou. Tudo isto para dizer, definitivamente: “agora sei, sou só!”

 

Surpreende, certamente, o conteúdo do parágrafo anterior. Como quase sempre, intencionalmente pouco claro, deixa, todavia, entreaberta a porta reveladora pelo menos do ajustamento comportamental que ao Alemão faltava e que o tempo vivido há muito aconselha. “A gente cansa de tentar… de querer… de acreditar… aí chega um dia, que a gente finalmente cansa… de cansar!!!” - Maria Aparecia Francisquini.

 

Em dezembro de 2022, na História nº. 84, já explorava o tema: “A desumanização a que chegou a relação entre os homens, o impune espezinhamento dos valores morais sobre os quais tantos ergueram a sua vida e que agora assistem ao seu desmoronamento, a prática do “vale-tudo” no dia a dia onde solidariedade, honestidade, lealdade, respeito e verdade são agora, e já de algum tempo, meras palavras, deixam o Alemão em estado de desalento: o mundo está mesmo em destravada decadência… Há uma espécie de cansaço a sugerir adequado repouso. Por um tempo, por todo o tempo?...”

 

Na prática, que se veja, nada muda. Ocorre, sim, uma arrumação interior que pacifique o que ainda for a tempo de o ser. A agitação e agressividade do dia a dia num mundo em constante desassossego, a perda irrecuperável de valores tão ricos desde há muito transmitidos por homens simples, mas sãos, o desrespeito pelo sofrimento do próximo, tornam a vida pouco menos que suportável.

 

Não se trata de nenhuma desistência, mas sim de um reposicionamento pessoal que os amigos, os bons amigos, não deixarão de compreender. “Aliás – descubro eu agora - eu também não faço a menor falta, e até o que escrevo um outro escreveria.” – Clarice Lispector.

 

Mas, apesar de tudo isto, o Alemão vai continuar por aí!...  

 

“Olhei uma foto minha e senti saudade do meu tempo de ingenuidade, saudade do tempo que eu acreditava cegamente nas pessoas.”

-Glauber Arikener 



    

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