sexta-feira, 30 de junho de 2023




 HISTÓRIA Nº. 94

 


          “É sabido que na infância o tempo não passa, na adolescência demora-se, na idade adulta corre, na velhice precipita-se.”

Rosa Lobato de Faria

 


Cada tempo vivido foi deixando sinais da sua passagem. Descuidadas cicatrizes, mais leves umas, mais fundas e bem visíveis outras, mas todas indeléveis.  “Marcas da vida em relevo”, como bem lhes chamou um amigo de longa data, realçando a dureza de tempos não muito distantes e valorizando a força revelada nas lutas então travadas, nem sempre vencidas. Testemunhos verdadeiros de ferimentos entretanto curados. Será que o tempo cura tudo?...

 

Toda a viagem tem um começo, meio e fim. O Alemão procura discretamente posicionar-se. Vai conferindo atentamente o que o rodeia para melhor caraterizar o momento que vive e, por via disso, considerar ou desconsiderar novas lutas, novos esforços. As cicatrizes desenhadas no seu ser são, na sua maioria, marcas das suas vitórias, das vitórias que Deus lhe concedeu. Arriscar mais cicatrizes, valerá a pena? Num mundo que já pouco ou nada lhe diz haverá ainda espaço para novas conquistas? Acredita que não...   

 

O Alemão, por quem alguém ainda vai perguntando, percebendo como o tempo se precipita, não resiste a transcrever, com a devida vénia, um poema de Mário Quintana sobre a brevidade da vida:

 

“A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.

Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…

Quando se vê, já é 6ª. Feira…

Quando se vê, passaram 60 anos!

Agora, é tarde demais para ser reprovado…

E se me dessem -um dia- uma outra oportunidade,

eu nem olhava o relógio

seguia sempre em frente…

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.”

 

Parece uma renúncia, uma desistência, mas não é, garante o Alemão. Não se desiste do que se ama. Será, quando muito, um reposicionamento face ao “tempo que se precipita” e ao que ainda deseja fazer, se Deus o ajudar: o avivamento da sua galeria de notáveis onde “nunca ninguém morre, só quem nós matamos na memória, no pensamento e no coração” – Rosa Lobato de Faria.




 

 

sexta-feira, 9 de junho de 2023



HISTÓRIA Nº. 93

 

O que fizeram do homem, da vida, do mundo?...

 

Palavras que ninguém ouve porque não as diz. Gestos que ninguém vê porque não os faz. Olhares que ninguém interpreta porque são vazios. Ausência de expressão, a invisibilidade possível. Imobilismo que contraria a vida. Um manto de aparente quietude cobre os caminhos que já não percorre. Excesso de paz que não tranquiliza, sossego agitado, como quem dorme e não repousa. Nada acontece!

 

Sucedem-se os dias sem que deles espere o que já não sonha. Sempre que o fez, sem a presença de pesadelos, reuniu material que lhe permitiu antecipar um futuro que afinal não chegou. Em seu lugar veio outro, o que não projetou… Ao contrário do que alguém disse, o sonho não comanda a vida!

 

No tempo em que se atreveu a ter voz não foi ouvido. Era previsível o aparecimento de encruzilhadas a dificultar escolhas..., felizmente, até hoje, por indicações superiores, acertadas. Mas mais dificuldades surgirão. O resto (que resto?!...) do caminho, cuja estreiteza se acentua cada vez mais à medida que nele se avança, prenuncia exigências de firmeza e de fé como garantias de superação.

 

O que fizeram do homem, da vida, do mundo? “O mundo já caiu, só me resta dançar sobre os destroços” – (Clarice Lispector).