sexta-feira, 20 de abril de 2018




HISTÓRIA Nº. 27



O descanso do Alemão…



Chegou finalmente o calor! Ansiosamente aguardado, diga-se. Depois de meses e meses de maior recolhimento doméstico por causa do frio e da chuva, a situação mudou. A baixa da cidade confirma-o. E os sinais são diversos. A mudança do traje pesado para o mais leve, leve…  As esplanadas a abarrotarem de gente. As escapadinhas que muitos aproveitam e bem. A alegria voltou para muitos. A vida são dois dias…. Viva o Sol! Viva a Liberdade! Viva a Vida!


Do lugar de onde observa o dia a dia, à distância, o Alemão acompanha toda esta agitação temporal e tenta perceber porque será que as esplanadas e as escapadinhas já não o seduzem. Num tempo em que tanto se aconselha a convivência e a proximidade entre as pessoas, o Alemão percebe, com tristeza, que caminha em sentido contrário. Velhice precoce? Deceções? Desconfianças? Incompreensões? Cansaço?...  


O Alemão sempre foi reservado. Tímido e de poucas palavras, foi suportando as investidas da vida sem grandes cuidados defensivos. Tudo boa gente, pensava. E mesmo quando alguém o magoava, não respondia pelo receio de ofender....  Consolidada desta forma a sua personalidade, já não vai a tempo de a mudar.  Tem vindo a colecionar experiências que, na fase da vida em que se encontra, lhe recomendam um determinado e inevitável caminho 


Deve ser cansaço, sim, muito cansaço acumulado, concluiu o Alemão. Não no corpo, até porque não cumpre os conselhos de atividade física que alguns experts lhe recomendam. E, sempre que pode, não dispensa a sesta após o almoço que aprendeu e apreendeu a partir da aposentação. Será então na alma? Ou no espírito? As áreas interrogadas o Alemão não se atreve a tentar sequer analisá-las. Pelo menos por agora. Embora perceba que é por aí que se esconde e manifesta o cansaço que o assola. Chegado aqui, não tem dúvidas de que precisa dar descanso ao que, dentro de si, dele tanto precisa. E o Alemão sabe onde O encontrar…    











sexta-feira, 6 de abril de 2018





HISTÓRIA Nº. 26



O barulho do mundo…



“Não deixe que o barulho do mundo atrapalhe o som da voz de Deus”. Mensagem, a primeira, recebida no dia de hoje. Linda. Oportuna. Chegou antecedida do toque-aviso mais suave ativado no seu simples smartphone. Os barulhos evita-os, sempre que pode. O Alemão estranha que, com o avançar dos anos e ao contrário do que é natural, estejam mais apurados os seus sentidos. Sobretudo a audição…


Há muitos anos, trabalhador, músico e estudante, aconselharam-no em alta voz, no meio de muitas pessoas: “Alemão, cuidado com a cultura”. Registou. Sem perceber. Cursava o humilde secundário com a esperança de aceder ao superior. O que felizmente aconteceu e lhe permitiu uma simples licenciatura cuja utilidade ainda hoje não percebeu. Pretenderia tal conselho preveni-lo contra o barulho que a cultura pudesse vir a provocar na sua vida ao ponto de “atrapalhar o som da voz de Deus” que sempre soube distinguir nos mais diversos ambientes? O Alemão atravessou na vida “regiões” muito ruidosas. Mas, até hoje, em nenhuma sentiu atrapalhado o som da Voz que o tem guiado.


O Alemão, humilde e medianamente culto, acha que muito do barulho do mundo é fruto da ignorância travestida de conhecimento. Também do egoísmo e da ambição desmedida. Tanta falsa sabedoria. Tanto convencimento. Tanto interesseirismo. O ruído irritante de quem domina, ou acha que domina, sobre tudo o que gira à sua volta ultrapassa, de longe, os decibéis que uma boa dose de sensatez deveria permitir. Tanto barulho-loucura. Tanto barulho-ambição. Tanto barulho-imposição de ideias.  Tanto barulho-poder. Tanto barulho-arrogância. Tanto barulho-folclore. Tanta gritaria. E afinal, tudo passa, tudo passará!...


Quanto ao barulho que o mundo faz, nada a fazer. Ou melhor, talvez tentar vencê-lo. A partir duma maior concentração-atenção no som da voz de Deus. O Alemão acredita que, desta forma, aquele barulho deixará de incomodar…